sábado, 27 de março de 2010

Homem que nem era tão homem...


Pego o ônibus e acabo dormindo, afinal a escola também cansa, as pessoas também me cansam, acabei dando voltas e voltas no ônibus, e agora tem um senhor me chamando, dizendo que eu preciso descer, afinal só restou eu ali, e esta no final da linha, meio atordoada o pergunto que horas são, ele responde dizendo que são 22:40, fico assustada com a hora e desço, olho meu celular e ele está descarregado e acaba desligando, olho para os lados e fico assustada, não sei exatamente onde estava, e além do mais á rua não era das mais iluminadas, dou algum passos para ver se meu inconsciente consegue reconhecer esse lugar, e percebo que não, resolvo voltar para falar com o bom senhor que me acordou, mas ele já não está mais ali, o ônibus também já não está mais ali, fico nervosa, com frio, e principalmente com medo, varias coisas passam pela minha cabeça, e eu fico sem saber o que fazer, não poderia andar já que não conheço esse lugar, mas também não poderia ficar aqui, servindo de isca para pessoas más, de início eu resolvo sentar, e ainda estou meio atordoada, porque de fato, odeio que me acordem, e o vento frio me faz estremecer, faz meu lábios tremerem, faz com que eu me encolha de uma forma irreconhecível, o medo se senta ao meu lado, o nervosismo resolve ficar dentro da minha bolsa, e eu fico me perguntando que tipo de rua é essa que não passa ninguém, que não tem movimentação de carro ou de tudo? E o medo está gritando ao meu lado, e resolvo ignorar, porque o medo só quer me atormentar, e resolvo colocar minha imaginação para funcionar, e penso está em todo e qualquer lugar que tenha pessoas, e uma iluminação ótima, mas como vou chegar a esse lugar se continuo aqui sentada?
Resolvo que preciso andar, mas também me questiono se enquanto eu estive aqui nada me aconteceu, porque eu vou sair? Mas e se eu continuar vai acontecer? E o medo grita cada vez mais alto ao meu lado, penso no quanto a mamãe me faz falta nessas horas, penso em tudo, penso até em coisas que não fiz e que realmente precisava fazer, penso em sobreviver dessa rua estranha, penso em como sou nova, e como tenho que viver muitas coisas ainda, mas em ruas bem claras, penso tantos exageros que no fim acabam sendo reais, e do nada, sem barulho algum, ou melhor só se eu não percebi, sinto que jogaram um balde de água em mim, volto ao mundo real e vejo uma poça de água em minha frente e uma moto á uns quatro metros longe de mim, a moto para, e eu me levanto e recuo, e observo cada detalhe, daquela única movimentação ali além de mim, observo a placa da moto, e vejo que o homem que estava na moto era um pouco mais alto que eu, estava de calça jeans, moletom verde, e não parecia ser tão homem assim, devia ser apenas um pouco mais velho que eu, mas ainda sim continuo recuando, contra a vontade da razão que insistia em me dizer que eu tinha que sair correndo dali, mas ainda sim eu queria ficar, queria ser corajosa apenas uma vez, e o homem que nem era tão homem tira o capacete preto, e seus cabelos caem quase sobre seus ombros, ele olha para mim e sorri, e eu fico com medo desse sorriso, recuo ainda mais, ele realmente não era tão homem, seus olhos eram de um castanho jamais vistos por mim, de um castanho intrigante que me fazia continua o encarando mesmo com minhas pernas tremendo, e ele dizia alguma coisa, mas eu não conseguia ou não queria escutar, e isso e culpa do medo, porque ele sempre faz isso comigo, ele para me olha de uma forma, e fala de novo, e depois sorrir, era o olhar dele que me prendia ali, por mais que eu quisesse correr, sabia que talvez nunca mais eu pudesse olhar para um olhar como aquele, ele dá uns três passos e quando vejo ele já está bem perto de mim, e diz com uma voz grossa e realmente, admito, encantadora: Desculpas!
Eu penso em correr, em fugir, mas aqueles olhos castanhos, aquela voz, me intrigavam de uma forma, que a única coisa que conseguir fazer foi balançar a cabeça dando a entender que tinha aceitado as desculpas dele, ele me olha e vê que eu estava em um estado precário, vê que eu pareço uma criança doente e sem cobertor, e lentamente tira o moletom e o coloca em minha volta, eu realmente poderia fazer alguma coisa, mas as únicas coisas que queria além daquele moletom, era a mamãe e um abraço...
Ele se aproxima ainda mais, e pergunta o que eu estava fazendo ali, naquela hora, e sozinha, eu demoro uns três minutos para responder, e acho que ela acaba percebendo que estou com medo, tanto medo que isso me faz travar e não falar!
Ele diz que eu não preciso ficar com medo, ele não vai me machucar ou fazer qualquer coisa do tipo, que ele só quer me ajudar.
Eu o encaro mais uma vez e conto a historia de uma forma resumida e que estou com medo e com frio, e que estou me sentindo um lixo naquele estado e que apenas queria voltar para a casa, ele diz que estou ótima e se oferece para me levar em casa, digo o endereço, ele segura na minha mão e me leva em direção a moto, ele faz com que eu coloque meus braços ao redor dele de uma forma tão forte como se eu fosse cair dali a qualquer hora, e eu coloco minha cabeça nas costas dele, e peço para Deus que ele não seja nenhum canalha, que realmente fique tudo bem! Ele parece estar ofegante e eu acho isso estranho, mas estava em um estado que não podia achar nada, no caminho ele me fazia algumas perguntas, se era pra direita ou pra esquerda, e depois de uns longos minutos chegamos na frente de casa, e está tudo fechado e penso em tudo que vou ter que ouvir da mamãe, ele desce da moto e me ajuda a descer, e enfim resolve perguntar meu nome, eu respondo, e ele responde dizendo também o nome dele, ele sorrir e diz que tem que ir, que o que de melhor que tinha que acontecer na noite dele já aconteceu, eu agradeço inúmeras vezes, porque ele foi o meu herói aquela noite, de fato! E ele diz que a única forma que tenho de agradecer e dando o meu telefone e um abraço, ele anota meu telefone, e depois me abraça, e percebo que agora a única coisa que eu queria mais do que aquele moletom, do que aquele homem que nem é tão homem, daquele abraço, era a mamãe! Quando ele tenta me largar eu abraço mais forte, acho que ele entendeu que eu estava realmente precisando daquilo, e o frio não se faz mais tão presente assim, já que o calor do corpo dele estava junto ao meu, ele para e me olha fixamente, e eu com uma vontade enorme de roubar aqueles lindos olhos castanhos dele, e ele se aproxima e me beija, e eu apenas me deixo levar, deixo toda a tensão daquela noite de lado e me concentro apenas em nossos lábios, e quando ele tenta sair, eu o faço voltar, e acho que ele percebeu o que eu quis dizer, e ele coloca os braços em volta de mim com mais força me apertando e eu finjo nem ligar, e enfim nossos lábios se separam, ele me olha e diz que eu continuo ótima, e repeti que fui a melhor coisa daquela noite, talvez até daquele mês, eu apenas fico sorrindo sem graça, ele acena e me joga um beijo, e caminha em direção á moto, e eu o observo suspirando, sem saber como explicar o que tinha acontecido ali, e quando dou por mim, percebo que ainda estou com o moletom dele, e o moletom tinha o cheiro dele, e percebo que ele era apenas um homem que nem era tão homem, que eu nem conhecia, que apenas sabia o nome, mas que de alguma forma jamais o esqueceria, não com o que ele fez, não com a forma que ele me olhou, não com aqueles olhos castanhos, não com aquele cheiro que agora estava impregnado em mim, não com aqueles lábios...

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